Pela internet, temos encontrado muitas propagandas do Opera GX, mas a pergunta que não quer calar, afinal, o que é um navegador gamer? Será que o Open GX realmente tem algo de especial, ou é tão gamer quanto uma cadeira? O Opera GX é gratuito, mas com tanto marketing assim, de onde está vindo todo esse dinheiro?
Testamos o Opera GX por alguns dias, pesquisamos, lemos os termos de uso, os relatórios de investidores da Opera, fizemos monitoramento de tráfego, tudo para tentar entender se as promessas do Opera GX fazem algum sentido, ou se é só marketing.
O que o Opera GX apresenta?
O Opera GX é uma variação do clássico navegador Opera, mas focado no público gamer, o principal diferencial do Opera GX pode ser visto logo no site oficial, um painel lateral com ferramentas para limitar o uso de “CPU, RAM e Rede” pelo navegador, algo que supostamente deve ajudar nos jogos. Será que essas ferramentas realmente funcionam?
Acessando o menu “Recursos” no site, podemos alguns destaques que o Opera GX oferece, como a possibilidade de integrar mensageiros na lateral, ou notificações da Twitch, algo bem legal, mas não único, já que o Vivaldi também faz isso.
Podemos ver que o Opera GX bloqueia anúncios, tem até uma VPN gratuita! Ele se integra com IA, tem o “flow” uma forma de transferir arquivos entre o Smartphone e o PC, tem a parte dos Pins, permitindo favoritar as coisas de forma diferente.
É um navegador bacana, nenhuma dessas coisas é única, temos várias outras ferramentas no mercado que fazem o mesmo, de forma até melhor, mas está tudo ali, integrado.
Outra parte que se destaca, é o design, as cores, os temas, os efeitos sonoros que o navegador tem, para dar um ar “gamer” de fato, talvez esse seja o ponto positivo menos discutível de todos.
Temos ainda o GX Corner, uma aba fixa, basicamente um blog com notícias sobre games e jogos grátis. Bastaria acessar “gx-corner.opera.com” que, em teoria, acessaríamos página, mas o Opera bloqueou para só funcionar no Opera GX. É uma forma de implementar um recurso que consideram um diferencial, semelhante a um dos benefícios que oferecemos aos membros Diolinux.
Primeiro, falemos sobre a ferramenta de limitação de recursos, com ela, você pode limitar o uso de CPU, memória RAM e download do Opera GX. Esse recurso vende o navegador para alguns gamers logo de cara, parece legal poder limitar a forma com que o sistema operacional manuseia os processos, mas não é tão simples.
Limitador de uso do hardware
Boas ideias são copiadas. Se limitar o uso de recursos manualmente fosse bom, seria padrão de todos os navegadores. O uso de CPU e RAM para todos os processos de um sistema operacional é ditado pelo kernel, num nível muito mais privilegiado do que uma aplicação comum, como um navegador.
Para o navegador poder fazer ajustes profundos, ele tem que ter permissões que nenhum navegador deveria ter. O Opera GX, felizmente, não faz isso, ele tenta disfarçar para o Windows quanto de recurso de hardware está precisando.
Por esse motivo, ao limitar o consumo de RAM, o navegador fica mais lento, aparecendo até mensagens sobre a deterioração de desempenho, porque o usuário está efetivamente pedindo ao programa para rodar “pior”. Se fosse possível rodar o navegador normalmente usando menos recursos, por que esse não seria o padrão?
Nessa tela você pode ver o Opera GX, o Chrome e Edge abertos ao mesmo tempo, com as mesmas 7 abas abertas.
Comparando com Chrome e Edge, com as mesmas 7 abas abertas, o Opera GX é o que mais gasta memória RAM, dobrando o número de páginas, a métrica se mantém, sempre ficando uns 300MB acima da concorrência, mais ou menos.
A ironia é que muitos dos recursos que o Opera GX tem para tornar ele “gamer”, podem acabar sendo causadores do uso maior de memória RAM. Se você observar a gestão de processos do navegador, fica mais claro, só o “gx corner” ocupa 140MB de RAM, o speed dial ocupa uns 50MB.
Usar RAM não é algo ruim, especialmente no desktop, certamente os engenheiros da Opera sabem disso. Diferente do que acontece em servidores, onde você paga geralmente por recurso usado, de modo que quanto menor a aplicação, mais barato se torna escalar um projeto, no desktop você já comprou a memória, se elas estiverem paradas, sem uso, é um desperdício.
Provavelmente por conta do marketing, o Opera GX toma o caminho contrário, dando a entender que permitindo que você limite o seu uso de RAM, terá melhor experiência, o que não necessariamente ocorre. Quando você limita o Opera GX para ele usar, 1GB, que é mínimo possível, já que com menos, corre o risco do navegador nem funcionar direito, o que ocorre é que as suas abas começam a hibernar.
Quanto menos memória RAM você coloca no limitador, mais cedo as abas vão começar a adormecer, porém, se você ficar alternando o uso das abas, ele não conseguirá controlar corretamente, o uso de RAM vai oscilar.
Toda vez que acordar ou colocar para dormir uma aba, usará ciclos do seu CPU, algo que não aconteceria se você não tivesse feito isso. Por maior gênio da computação que você seja, provavelmente não saberá gerenciar a alocação de recursos de hardware melhor do que o kernel do Windows em tempo real.
Na prática, quando limita o uso de CPU e RAM, está dizendo ao Opera GX que ele tá rodando num hardware mais fraco, ele não vai ficar mais leve para manter o desempenho, mas fará as coisas mais devagar.
O que você espera conseguir com essa limitação de recursos? Fazer o navegador atrapalhar menos outros processos?
Se para fazer isso acontecer, você precisa deixar o lavegador mais travado, com abas paradas que vão precisar ser recarregadas quando você clicar, não seria ainda mais efetivo fechar essas abas ou fechar o navegador por completo?
A ideia de suspender abas não é nova, há várias extensões que fazem isso, em recentes versões do Chromium, o projeto open source por trás do Opera, do Chrome, do Edge e vários outros navegadores, implementaram essa função nativamente de forma automática.
Quando um software pesado, como o jogo, vai para primeiro plano, o Kernel do sistema operacional automaticamente aloca recursos, você não precisa fazer isso manualmente.
Limitador de internet
Um recurso de limitação que faz algum sentido no Opera GX, é o limitador de velocidade de download, ele funciona adequadamente, no sentido de limitar a velocidade dos downloads pelo navegador. Mesmo assim parece algo desnecessário, na maior parte do tempo queremos fazer a velocidade dos downloads aumentar.
Um caso de uso é, ao fazer o download de algo e limitar a velocidade, porque outra pessoa está assistindo algum streaming, e você não quer atrapalhar a qualidade. É um caso específico, mas tem a sua utilidade, mesmo assim temos várias outras formas para contornar esse problema, como usar um gestor de downloads ou de torrents, com mais opções, os launchers de games, como o Steam, tem limitadores assim embutidos, sem falar que, em tese, roteadores modernos sabem identificar o fluxo de rede, e alocar pacotes conforme a necessidade.
O modelo de negócios do Opera GX
Agora, podemos falar sobre o modelo de negócios do Opera GX, abrindo espaço para outros recursos de destaque do navegador, a VPN e o bloqueador de anúncios e rastreadores.
A Opera é uma empresa de anúncios online, segundo os termos de uso e privacidade, eles ganham dinheiro colocando sites específicos no speed dial do navegador, a tela inicial, prática comum em outros navegadores.
Eles ganham dinheiro através da promoção de certos jogos, o que significa que o GX Corner não é baseado necessariamente nas melhores opções para você, mas no que funciona para eles também.
Além disso, a Opera é uma empresa que faz uso e tratamento de dados para publicidade direcionada. Por exemplo, a tal da VPN grátis.
Como funciona a VPN grátis do Opera?
Sabemos que não existe almoço grátis, se eles não estão te cobrando pelo navegador, não estão te cobrando pela “VPN”, de alguma outra forma você está pagando. A ideia de passar toda a sua conexão por servidores da própria empresa, como uma “VPN”, ajuda muito na hora de coletar informações de forma mais precisa.
Praticamente todos os navegadores do mercado coletam dados dos usuários em algum nível, até alguns que dizem que não fazerem isso. Se você se sente confortável com isso ou não, é algo pessoal.
Nosso ponto não são os dados que a Opera levanta dos seus usuários, afinal, você concorda com os termos assim que instala o navegador, o que chama a atenção é o gato por lebre que essa VPN parece ser.
O site especializado em VPN “TOP10VPN” fez uma análise detalhada sobre funcionamento da tal VPN gratuita do Opera e do Opera GX, concluindo que apesar de funcionar de forma semelhante a uma VPN em alguns sentidos, o serviço não é tecnicamente uma VPN, sendo algo mais parecido com um Proxy. Tem até uma implementação dele no GitHub para usar fora do navegador, chamado de “opera proxy”
Conforme o TOP10VPN:
“Há pouca informação sobre os recursos de segurança do Opera, provavelmente por eles serem praticamente inexistentes.
Não apenas o chamado ‘OperaVPN’ não usa protocolos de VPN, como tem a ausência de outros recursos importantes de segurança…
…Apesar disso, os últimos testes não mostraram nenhum vazamento de dados….”
Isso faz qualquer pessoa que queira usar uma VPN para fins de privacidade e segurança não poder contar com essa opção, sua a única finalidade seria mascarar o endereço de IP.
Analisamos as conexões, assim que ativamos a VPN gratuita do Opera GX ele começa a passar todo o tráfego do navegador por uma URL específica, chamada “api2.sec-tunnel.com”. Aparentemente, ela não funciona muito bem, jogando o usuário para locais diferentes do mundo, mesmo que escolha uma região específica.
Lembre-se que este é um serviço gratuito, você recebe o que paga. Se considera VPN um assunto sério, pode ser melhor contratar um serviço renomado ou fazer a sua própria.
Nos termos de uso, especificamente no terceiro termo, parágrafo “e” diz que:
“A Opera não garante a disponibilidade do serviço de VPN. O recurso da VPN não é um serviço end-to-end, sem garantia de que qualquer dado trafegado enquanto a VPN é usada, ficará seguro.”
E a VPN PRO do Opera, como funciona?
Por mais ou menos 20 reais por mês, você adquire um serviço de VPN de verdade, protegendo toda a conexão do seu computador, e não apenas o navegador, com até 3000 servidores ao redor do mundo.
Até aí tudo bem, mas tem alguns detalhes nos termos que são bem curiosos. Para usar a VPN PRO você precisa ter uma conta Opera, o que era de se esperar, mas a infraestrutura da VPN PRO não é mantida pela Opera, mas por uma empresa terceira, parceira, que não foi nominada nesses termos, por conta disso, usa servidores diferentes dos que se usa na versão grátis da VPN.
Quanto à Privacidade e Segurança, o 12º termo dessa sessão, fala que “como a VPN PRO é provida por terceiros, a responsabilidade da privacidade e segurança é dessa empresa terceira”
No documento também afirmam que, na VPN PRO, as comunicações são criptografadas e roteadas por vários servidores, como é de se esperar num bom serviço de VPN, mas adicionam:
“…não prometemos que o serviço será absolutamente seguro. Apesar de nos esforçarmos para isso, criminosos ainda podem acessar os seus dados”
Apesar de soar chocante para alguns, o Opera tem seus motivos, já que esse é um posicionamento legal relativamente comum, afinal, não há como garantir que você não vai ser hackeado. há inúmeras formas disso acontecer, desde exploits zero day, até engenharia social, nesses casos, não tem VPN que dê jeito.
O adicional é que a Opera não tem controle de fato sobre o funcionamento do serviço, mesmo que deem essa impressão. Se você precisar processar a Opera por vazamento de dados na VPN PRO, não sabemos quem responderia.
Eles mencionam nos termos, que é um serviço com zero logs e que os dados dos usuários não são coletados usando a VPN PRO. Podemos dar crédito, afinal, a Opera coleta muitos dados, mas esses não são servidores deles. Agora, o que a empresa sem nome faz ou deixa de fazer, é difícil dizer.
Bloqueador de anúncios do Opera GX
O outro ponto relacionado a privacidade e segurança que o Opera GX faz uso é um bloqueador de anúncios e de trackers nativo. Eles funcionam mais ou menos, em nossa experiência, bloqueia alguns anúncios enquanto deixa passar outros, às vezes. Lendo os termos de uso, você começa a entender o porquê.
Na verdade, ao ativar o bloqueador, indo nas configurações, vemos já começa com algumas exceções em alguns sites, como Google e Bing, você pode alterar elas se quiser, mas esse é o padrão.
O motivo disso é simples, anúncios e dados são as maiores fontes de receita da Opera. Como a Opera tem ações na bolsa, não é tão difícil encontrar relatórios que mostram o faturamento da empresa, o que foi feito e o planejamento.
Essas páginas precisam ser públicas para qualquer empresa que esteja listada na bolsa, atraindo investidores sérios, mas não costumam ser lidas pelos usuários. Existem apresentações que mostram como a Opera monetiza seus usuários, e como isso tem tudo a ver com anúncios.
Existe até um site, no estilo Google Ads, da Opera, onde anunciantes podem expor para o público do Opera GX e para Opera normal. Como uma empresa com uma VPN, que bloqueia anúncios e rastreadores no seu próprio navegador, ganha dinheiro com anúncios?
O que acontece é que, especialmente quando você bloqueia ADS, a Opera pode localizá-los nas páginas onde navega, analisar os dados do anúncio que apareceria ali, e ofertar essas informações aos seus próprios clientes.
Ao invés de você entrar num site e ver um anúncio vindo direto do Google ADS, o Opera bloqueou aquele anúncio, mas exibiu outro no lugar, sendo esse um espaço publicitário comprado pelos seus clientes.
Não é muito diferente de outras extensões, navegadores e serviços que oferecem bloqueadores de anúncio, se você observar as informações sobre monetização do Adblock Plus, uma das extensões mais populares, isso fica claro.
Basicamente os anúncios serão bloqueados para serem exibidos por quem pagar para isso, é quase um sequestro de espaço publicitário. Quando isso não acontece, os dados podem ser usados para a publicidade ser direcionada em outro aplicativo, não necessariamente no navegador.
Se a ideia é bloquear anúncios, soluções open source, sem fins lucrativos, deve ser mais interessantes, como o Pi-Hole.
Não sei como você se sente em relação ao Opera GX, há quem considere uma das maravilhas no mundo Tech, mas conforme analisamos, é no máximo um navegador “ok’, com um marketing poderoso, especialmente se você entende um pouco mais do que o básico sobre tecnologia e marketing.
O discurso de marketing recente do navegador mudou um pouco, se referindo como um “navegador para gamers”, ao invés de um navegador gamer exatamente, e isso tá um pouco mais alinhado com a proposta de fato.
É natural eles trabalharem com publicidade e marketing digital, mas não parece legal fazerem isso enquanto dão a entender que estão protegendo a privacidade ativamente, com VPN que não é VPN, e bloqueador de anúncio, que vende anúncio.
O Opera GX foi um dos poucos navegadores que ficaram de fora da comparação que fizemos entre vários disponíveis, apesar do Opera original estar presente!
