Quando depositamos grandes expectativas em algo, a decepção surge quase como uma lei natural. Foi exatamente o que aconteceu quando a equipe do Fedora anunciou que a versão KDE seria promovida a edição oficial no lançamento do Fedora 42. A empolgação foi imediata: finalmente teríamos uma distribuição com KDE praticamente puro, recebendo o mesmo nível de atenção, recursos e cuidado que a edição GNOME já possui. A perspectiva de uma experiência polida e amigável para novos usuários, aproximando-se até mesmo da usabilidade do SteamOS, parecia estar ao alcance.
Porém, após testar a versão beta, a sensação que ficou foi de que ainda há um abismo considerável entre as duas edições. O Fedora KDE continua parecendo uma spin disfarçada, enquanto o Fedora Workstation (GNOME) mantém seu padrão de excelência.
As principais novidades do Fedora 42
Antes de analisarmos a fundo as diferenças entre as edições GNOME e KDE, é importante destacar as mudanças mais significativas que acompanham esta nova versão da distribuição.
A aposentadoria do Anaconda e o novo instalador
O antigo instalador Anaconda, conhecido por suas escolhas questionáveis de experiência do usuário, finalmente foi substituído. Seu design confuso, com confirmações redundantes e fluxo antinatural de tarefas, era motivo de frustração para muitos. O novo instalador chega como um sopro de ar fresco, com uma interface mais limpa e intuitiva.

Entre as melhorias mais notáveis está a possibilidade de reinstalar o sistema sem perder os dados do usuário, funcionalidade extremamente útil para situações onde uma restauração do sistema se faz necessária. O particionamento automático também foi simplificado, permitindo que usuários menos técnicos configurem seu disco sem precisar lidar com detalhes avançados. Para quem deseja configurar um dual boot, o processo se tornou mais direto: basta selecionar o espaço disponível no disco e o instalador cuida do resto.
Embora essas mudanças possam parecer óbvias para qualquer um familiarizado com boas práticas de UX, elas representam um avanço significativo para o Fedora. O antigo instalador era tão confuso que poderia facilmente ser usado como estudo de caso em cursos sobre o que não fazer em design de interfaces.
COSMIC: uma nova spin oficial
O Fedora 42 introduz uma nova spin baseada no COSMIC, o ambiente desktop em desenvolvimento pela System76 para o Pop!_OS. O interessante aqui é que, diferentemente do Unity (que permaneceu restrito ao Ubuntu e seus derivados diretos), o COSMIC está sendo adotado por múltiplas distribuições antes mesmo de seu lançamento oficial.
Esse movimento sugere um futuro promissor para o COSMIC, que já demonstra potencial para se tornar uma opção relevante no ecossistema Linux. Para os usuários do Fedora, essa spin representa uma oportunidade de experimentar um ambiente moderno e inovador sem precisar migrar para outra distribuição.
Atualizações técnicas
Como em qualquer novo lançamento, o Fedora 42 traz uma série de atualizações de pacotes e ajustes internos. Entre os destaques oficiais estão a nova versão do python-setuptools, melhorias no gerenciador de pacotes DNF (que agora remove automaticamente chaves GPG obsoletas) e a atualização para o SDL3, que deve beneficiar aplicações em tela cheia, como jogos.
Embora essas mudanças sejam relevantes para desenvolvedores e usuários avançados, é difícil não notar que a lista de novidades “empolgantes” para o público geral é um tanto escassa. A sensação é que, para a maioria dos usuários, o Fedora 42 representa mais uma evolução incremental do que uma revolução.
GNOME vs. KDE: a promessa de igualdade que ainda não se cumpriu
Um dos principais atrativos do Fedora 42 era a elevação do KDE Plasma ao status de edição oficial, teoricamente equiparando-o ao GNOME em termos de prioridade e qualidade. No entanto, após testar ambas as versões, fica claro que essa equiparação ainda não se concretizou.
Logo de cara, percebe-se uma disparidade na forma como as duas edições são apresentadas. Enquanto a versão GNOME é chamada de Fedora Workstation 42, a versão KDE recebe o nome de Fedora KDE Plasma Desktop. A diferença pode parecer sutil, mas transmite uma hierarquia implícita: um nome soa como um produto principal, enquanto o outro parece uma variante secundária.
A experiência do primeiro boot
O momento em que um usuário inicia o sistema pela primeira vez é crucial. É quando ele forma suas primeiras impressões e decide se vale a pena continuar usando a distribuição. Infelizmente, o Fedora KDE ainda peca nesse aspecto.
No GNOME, o processo de onboarding é fluido e bem estruturado. O usuário é guiado por etapas claras para configurar idioma, layout do teclado e outros ajustes básicos. O tour inicial, embora simples, oferece uma visão geral das funcionalidades do ambiente e pode ser pulado facilmente se o usuário preferir.
Já no KDE, a experiência é fragmentada. A tela de boas-vindas está sobrecarregada com texto excessivo e opções mal organizadas, criando uma barreira desnecessária para novos usuários.

O problema dos repositórios de terceiros
Uma das etapas mais importantes no setup inicial do Fedora é a ativação dos repositórios de terceiros, que fornecem codecs, drivers proprietários e acesso a aplicativos como Steam e Google Chrome. No GNOME, essa opção é apresentada de forma clara e centralizada, com um botão bem destacado que muda de estado após ser ativado, deixando claro que a ação foi concluída.
No KDE, o mesmo processo é menos intuitivo. O botão para habilitar os repositórios compete visualmente com outros elementos da interface, e após ser clicado, ele simplesmente muda de texto sem fornecer um feedback visual adequado. Além disso, o KDE exige autenticação de senha para confirmar a ação, enquanto o GNOME executa o processo em segundo plano sem interrupções desnecessárias.

Essas pequenas diferenças acumulam-se e criam uma experiência menos polida no KDE, reforçando a impressão de que ele ainda não recebeu o mesmo nível de atenção que o GNOME.
O modo live
A experiência no modo live (antes mesmo da instalação) também revela problemas de design no KDE. O ícone que inicia a instalação é pouco intuitivo, parecendo mais um logotipo do que um botão interativo. Para piorar, há uma mensagem de texto explicando que é necessário clicar nele para começar a instalação – um claro sinal de que o design falhou em comunicar sua função.
Além disso, o aplicativo de boas-vindas exibe uma série de páginas com informações sobre o sistema, mas a opção de instalação está logo na primeira tela. Se o usuário avança sem instalar, precisa voltar ou procurar o ícone no desktop, criando um fluxo confuso e pouco eficiente.

GNOME 48 e Plasma 6.3: o que há de novo nos ambientes?
As Novidades do GNOME 48
O Fedora 42 Workstation traz o GNOME 48, que inclui algumas melhorias interessantes. O novo painel de bem-estar digital permite monitorar o tempo de uso do sistema, uma funcionalidade que pode ser útil para quem busca reduzir distrações.
No aspecto técnico, o triple buffering no compositor de janelas promete animações mais fluidas e um desempenho melhor em hardware menos potente. O visualizador de imagens Loupe ganhou recursos básicos de edição, como recorte e ajustes simples.
Há também um novo aplicativo chamado Papers, destinado à leitura de documentos, embora ele ainda não estivesse disponível durante os testes com a versão beta.
Melhorias no KDE Plasma 6.3
Do lado do KDE, o Plasma 6.3 traz melhorias no suporte a mesas digitalizadoras, um avanço bem-vindo para artistas e designers. O monitor do sistema e o kinfo-center foram aprimorados, exibindo informações mais detalhadas sobre GPUs e consumo de bateria em dispositivos portáteis.
O Discover, gerenciador de pacotes do KDE, agora alerta quando aplicativos em sandbox tentam modificar suas configurações após uma atualização – uma adição importante para segurança.
Um novo aplicativo chamado Qrca foi incluído para leitura de QR codes, embora a escolha do nome (que lembra o leitor de tela Orca) possa causar confusão desnecessária, ainda mais considerando que o Orca é um aplicativo para a acessibilidade.
Vale a pena atualizar para o Fedora 42?
Para usuários do Fedora 41, a atualização para a versão 42 traz melhorias, mas nenhuma mudança radical. O novo instalador é um avanço significativo, e o kernel 6.14 oferece suporte a hardware mais recente, incluindo a tecla Copilot em alguns laptops.
Os drivers NVIDIA 570 e a Mesa 25 estão presentes, assim como um novo wallpaper com um easter egg referente ao Guia do Mochileiro das Galáxias – uma homenagem adequada, já que o número 42 tem significado especial na cultura geek.

No entanto, a esperada equiparação entre as edições GNOME e KDE ainda não se materializou. Enquanto o GNOME continua sendo uma experiência refinada e consistente, o KDE ainda parece um trabalho em progresso, com problemas de design e usabilidade que precisam ser resolvidos.
Se você já é usuário do Fedora e está satisfeito com sua configuração atual, não há pressa para atualizar. Na verdade, vale a pena esperar pelo menos um mês até que os bugs iniciais sejam sanados.