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Entrevistamos Chris Lamb, atual líder do projeto Debian

Atendendo aos pedidos de vocês na entrevista com Hualet Wang, líder do Deepin, vamos continuar falando com os líderes dos projetos e distribuições Linux mundo à fora. Hoje temos nada mais, nada menos, do que líder do projeto Debian, uma das maiores e mais importantes distribuições Linux da história, Chris Lamb, que aceitou o meu pedido e falou sobre coisas muito interessantes à respeito da distro lendária.

Temos o prazer de apresentar uma entrevista exclusiva do atual líder do Debian ao blog Diolinux, muitas perguntas foram inspiradas em questões levantadas pelos próprios usuários do Debian no Brasil, vamos ao bate-papo.

Diolinux: Qual o seu nome e qual a sua função dentro do projeto Debian?

Chris: Meu nome é Chris Lamb e eu sou o atual líder do projeto Debian (DPL) e também o atual representante oficial do Debian. Sou conhecido por “lamby” no IRC e @lolamby no Twitter.

O DPL (Debian Project Leader) tem duas funções principais, uma interna e outra externa.  A função externa é relativamente simples de entender, eu represento o Debian pelos outros integrantes, como nesta entrevista onde falo em nome do projeto. Isso também envolve dar palestras e fazer apresentações sobre o Debian em conferências, bem como criar relacionamentos com outras organizações e empresas.

Internamente o líder gerencia o projeto em si e define a sua visão sobre todas as questões em algum grau. O líder deve conversar com os outros desenvolvedores do Debian para ver como eles pode colaborar entre si, removendo qualquer bloqueio potencial para que isso aconteça, para que assim o Debian seja produzido. Umas das tarefas principais do líder do Debian envolve, portanto, a coordenação e comunicação. “Herding cats”, como dizem.

Diolinux: Desde quando você atua nesta função?

Chris: Após um período de campanha e de votação de 6 semanas, fui eleito no dia 17 de abril deste ano.

Diolinux: O que fez você querer fazer parte da comunidade Debian?

Chris: Minha primeira experiência com o Debian foi um “acidente feliz”. Eu tinha recebido um conjunto de CDs da Red Hat de um serviço chamado “The Linux Emporium”, uma empresa do Reino Unido que enviava CDs de distribuições GNU/Linux como um serviço prestado antes de termos a internet mais rápida para fazer downloads. No entanto eu acabei descobrindo que eu não tinha os 12 MB de RAM necessários para executar o instalador do Red Hat. Irritado eu peguei um CD do Debian “Potato” que estava incluído no kit que eu havia recebido (livre de encargos) no meu pedido, uma versão que já está muito desatualizada atualmente, e assim eu conheci o Debian, que funcionou no meu computador.

Avançando alguns anos, minha primeira contribuição para a comunidade foi trivial (um patch para o software de edição musical chamado Lilypond). Eu era um colaborador entusiasmado do Debian e fui infectado pelo vírus da colaboratividade, o que me levou a contribuir mais e mais com outros pacotes, fazendo com que eu passasse de um simples estudante do Google Summer Code para um desenvolvedor oficial do Debian em 2008. Participei da minha primeira DebConf (conferência anual do Debian) em Edimburgo, na Escócia.

Diolinux: Como você definiria o projeto Debian para as pessoas que já usam Linux, mas não o Debian?

Chris: No momento em que escrevo este texto mais de 10% da internet é alimentada pelo Debian. Quantos sites você poderia hoje sem o Debian? Debian é o sistema operacional de escolha de vários projetos, é o prjeto de escolha da estação espacial internacional (ISS), de inúmeras universidades ao redor do mundo, empresas, órgãos governamentais, todos eles confiam no Debian para prestar seus serviços à milhões de usuários em todo o mundo e além dele (literalmente). O Debian é um grande sucesso.

Penso que seria adequado dizer que o Debian tem a reputação de ser uma distro Linux para especialistas, no entanto, isso é um pouco enganador e injusto também, enquanto existem muitas distribuições que estendem o Debian para melhorar a sua interface e interação com os usuários em várias direções (como Ubuntu, Mint, etc), o núcleo subjacente do Debian não deve ser temido.

Nossos esforços são geralmente focados em liberar uma versão estável do Debian a cada 18 meses (ou mais), entretanto, o Debian também mantém uma distribuição para testes (Debian Testing), que talvez possa ser melhor entendido como a “área de testes” para a próxima versão. Há também a versão “instável”, que (apesar do nome enganador!) é completamente utilizável como um sistema do dia a dia. É semelhante as distros Rolling Release.

Diolinux: Todos sabemos que os principais objetivos do Debian são dois: Ter um sistema tão estável quanto possível e ser multiplataforma, incluindo o suporte a diferentes tipos de Kernel que não o Linux. Existe alguma outra meta ou objetivo do Debian que foge desta dualidade amplamente difundida? Existe alguma outra meta que você estão trabalhando para cumprir?

Chris: Você tem razão ao salientar que o Debian suporta também outros Kernels não-Linux, especificamente o kernel kfreebsd e você pode estar ciente também de que é possível ter também o (ainda muito experimental) kernel Hurd do projeto GNU.

A diversidade técnica do Debian se estende para além dos kernels, essa variedade significa que nós podemos disponibilizar o sistema para todo o tipo de equipamento, de pequenos dispositivos a grandes, notavelmente temos o Debian como base do Raspian, um dos principais sistemas operacionais para o Raspberry Pi, além de suportar sistemas gigantescos também, com mais de 100 GB de RAM, versatilidade realmente é um ponto forte do Debian.

Outro objetivo além da escalabilidade é oferecer uma múltipla gama de opções de desktop enviroments que você pode optar na hora da instalação, isso não requer que você baixe um sistema para cada uma delas, ou tenha que fazer uma mudança manual posterior (a menos que você queira, claro), tudo isso o Debian já te oferece.

Para todos que se importam com coisas como esta… é perfeitamente possível usar o Debian sem o systemd…  *g* 

Diolinux: Recentemente nós tivemos a informação de que houveram vários problemas e bugs nas ISOs live do Debian, o que é algo realmente incomum, aos poucos os problemas estão sendo solucionados, entretanto, observando as listas de e-mail do Debian nós podemos observar que a problema destas falhas estava muito relacionado a falta de testadores para estas ISOs. Eu gostaria de saber, como o público pode ajudar a debugar o Debian e fazê-lo melhor?

Chris: Claramente o problema com as ISOs live mostra que existem algumas lacunas no nosso processo de desenvolvimento, no entanto, a equipe está introduzindo novas métricas de desenvolvimento, tanto técnicas, quanto não-técnicas, para que isso não aconteça novamente.

Em termos de como a comunidade pode ajudar; testar novas versões betas das ISOS, dos instaladores, é algo que nós sempre apreciamos. Enquanto a atenção para o funcionamento do ambiente de usuário do Debian acaba recebendo muita atenção, eventualmente o instalador tem menos “globos oculares” sobre ele.

Diolinux: Você utiliza apenas Debian ou utiliza outras distribuições e sistemas operacionais? Qual o seu ponto de vista sobre sistemas proprietários?

Chris: Atualmente não uso apenas sistemas operacionais de software livre, mas todos rodam Debian!

Diolinux: Ouvindo os nossos leitores, alguns comentaram que não existe um forma de “fácil acesso” ao desenvolvedores do Debian, não existe um canal claro entre o Debian e o dito “usuário final”, isso pode se dever ao fato de realmente isso não existir ou a pura falta de divulgação e informação destes meios. Qual é a melhor forma de se envolver com o projeto? Que tipo de profissionais e entusiastas podem fazer parte da comunidade de desenvolvedores do Debian?

Chris: Existem várias formas para o público começar a participar. Para usuários comuns, existe a página de “Welcome” da Wiki: https://wiki.debian.org/Welcome/Users

Para pessoas interessadas em contribuir a nível de código, basta dar uma olhada aqui: https://www.debian.org/devel/

Mas também é possível observar a nova página de “Guia para mantenedores”: https://www.debian.org/doc/manuals/maint-guide/

Diolinux: Como você imagina que o Debian será daqui a 10 anos?

Chris: Primeiramente eu gostaria de me imaginar ainda como um contribuidor ativo do projeto Debian, não necessariamente líder, claro, acredito também que muitos dos desenvolvedores atuais do projeto continuarão nele neste período.

Em termos da “distribuição Debian”, acredito que o projeto sempre teve uma tradição bem moldada pela demanda dos usuários e desenvolvedores, bem como pelos esforços gerais e padronização na comunidade de software livre.  Nunca há uma imposição “vinda de cima” em um projeto como o Debian, acredito inclusive que esta é uma das principais razões para as pessoas escolherem o Debian para começar.

Não há razão para pensar que seria algo muito diferente disso em uma década, porém, mudanças sempre podem acontecer e é muito difícil de prever.

Diolinux: Deixe uma mensagem final para os nossos leitores e fãs do Debian no Brasil.

Chris: Eu apenas gostaria de agradecer a todos pela leitura da entrevista.

Finalizando

Eu gostaria de aproveitar a oportunidade para agradecer ao Chris pelo tempo dispensado na entrevista, ela foi toda feita por e-mail em inglês, então eu tive que fazer a tradução e adaptar alguns sentenças, contudo, gostaria de deixar claro que uma das respostas do senhor Lamb acabou ficando um pouco ambígua para mim, pois apensar de entender o que ele disse, não consegui interpretar ela completamente, por isso vou colocar aqui a resposta em inglês da pergunta “Você utiliza apenas Debian ou utiliza outras distribuições e sistemas operacionais? Qual o seu ponto de vista sobre sistemas proprietários?”:

“Currently, I not only exclusively use free software operating systems, they are all running Debian!”

Acho que poderia ser interpretado de diversas formas, você pode colocar como você entendeu a questão. No meu entendimento, a resposta pode dizer que ele não usa apenas Linux, mas Windows ou macOS também, mas que quando usa software livre é sempre Debian, ou que ele usa sempre Debian mas não apenas software livre. Se você tiver uma interpretação diferente, compartilhe nos comentários.

Edit: Troquei mais alguns e-mails com o Chris para entender melhor o que ele quis dizer. Ele me falou que quis dizer que “todos os seus computadores e servidores rodam Debian, ainda que não sejam 100% software livre”, devido a drivers e programas proprietários que ele usa, ou seja, fica mais pela minha segunda interpretação.

Gostaria de informar que já entrei em contato com Daniel Foré, desenvolvedor do elementary OS, estou aguardando a resposta dele também, pois até o momento ele não respondeu meu e-mail, se vocês puderem importuná-lo no Twitter para que ele responda eu agradeço. 😅

Deixem também sugestões para entrevistas, prometo sempre fazer o possível para conseguir o contato com as pessoas indicadas.

Até a próxima!

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