Em entrevista, Linus Torvalds fala sobre privacidade, CoC e Linux nos Desktops
Sistemas operacionais

Em entrevista, Linus Torvalds fala sobre privacidade, CoC e Linux nos Desktops

Linus Torvalds voltou para liderar o projeto Linux novamente e recentemente concedeu uma entrevista exclusiva para Swapnil Bhartiya, um ativista do mundo Open Source e redator recorrente do site da Linux Foundation, onde falou sobre a sua visão sobre algumas questões envolvendo o mundo Linux e a tecnologia Open Source, assim como a sua saída temporária do projeto e o novo código de conduta.

O vídeo de entrevista é um pouco longo, e não tem legendas em Português, mas é muito interessante. Nós selecionamos os tópicos comentados de maior relevância.

Os destaques da entrevista de Linus Torvalds

Linus comenta sobre o Linux no Dekstop ser possível através dos Chromebooks, mas enfatiza que ele ainda não usa um (Chromebook/Chrome SO) definitivamente apenas porque não consegue fazer os testes de kernel referentes ao seu trabalho com o Linux, fora isso, considera uma excelente experiência.

A conquista do Linux no Desktop

O comentário sobre os Chromebooks mostra o quanto a “conquista do desktop” ainda parece ser uma das poucas “pedras no sapato” de Torvalds. Bhartiya comenta que “apesar do Linux estar em todos os lugares“, Torvalds ainda considera importante o desktop.

Quando questionado sobre o que ele acha que poderia viabilizar a acensão do Linux nos desktops também, Torvalds comenta que acha importante uma padronização de distribuição de software, como Flatpak, AppImage ou Snap por exemplo, e agora com aplicativos .deb começando a ter suporte no Chrome OS, ele espera que o segmento desktop, ainda usado por muitas pessoas, possa avançar ainda mais com o uso do Linux. 

Linus  acredita que o Chrome OS e o Android são o caminho para isso, se diz otimista, ainda que: ” eu esteja otimista quanto ao desktop há mais 25 anos”, brinca, mas quem sabe o que nos espera no futuro. Muita coisa mudou nesse segmento nos últimos 8 à 10 anos.

O modelo de desenvolvimento Open Source

Torvalds comenta sobre o modelo open source ter se tornado o padrão de desenvolvimento hoje em dia, dizendo que entende que existam produtos de nicho que ainda encontrem maior valor o modo antigo de software proprietário, mas que até mesmo essas empresas (que trabalham com software proprietário) usam mais ou menos open source para prover seus serviços ou criar a sua infraestrutura de trabalho.

Quando questionado se ele se importa com a filosofia envolvida no Open Source ou Free Software (Software Livre), Linus comenta que tudo o que ele realmente se preocupa é com o código dos softwares Open Source, especialmente nos quais trabalha, e não com o modelo de negócio ou a filosofia por traz disso.

As pessoas mais antigas ligadas ao “freedom thing”, como descreve, se sentem muito mais ameaçadas por Facebook, Google, Apple, Microsoft, etc, por usarem softwares Open Source, mas manterem os dados dos usuários em seus serviços privados. Torvalds comenta que apesar de não preocupar-se com “esse tipo de coisa”, compreende quem acredita que o grande problema é onde os dados estão colocados, fora do seu controle físico, mas que entende que isso faz parte da evolução da tecnologia e dificilmente haverá algum “ponto de retorno”. 

Linus comenta também que entende que esse é o “ganha pão” de muitas empresas, e por consequência, o “ganha pão” de milhões de pessoas que trabalham com tecnologia, pessoas que usam Open Source muitas vezes em outros locais, que não em um dos produtos que trabalham.

Sobre privacidade

Linus comenta que não se preocupa muito com a sua privacidade online, mas admite que isso pode ser um problema considerável para muitas pessoas mais sensíveis a isso. Ele afirma que, como pessoa pública, não acha útil se preocupar demais com esse tipo de coisa, afinal, muita coisa dele já está na internet de forma pública.

Torvalds ainda comenta que a coleta de dados parece não ter volta também, afinal eles (os dados) são necessários para construir melhores produtos personalizados, a grande questão é você poder optar por oferecê-los ou não. Linus comenta que as pessoas dos EUA, de forma geral, ainda não “acordaram” para isso totalmente.

Sobre sua personalidade e o CoC (Código de conduta)

Linus comenta sobre seu comportamento ao responder e-mails da comunidade de desenvolvimento Linux, dizendo que prefere, hoje, evitar de responder algumas coisas e focar na resolução do problema, algo como: falar menos, fazer mais.

Quando questionado sobre sua saída do projeto por conta de desgaste ou por simplesmente ter “trabalhado demais”, Torvalds comenta  sobre “não estar cansado do Linux”, como muitos pensaram quando ele resolveu “tirar férias” recentemente. Complementou dizendo que foi período estressante, com vários problemas técnicos para serem resolvidos e que as vezes ele precisa de “um final de semana prolongado” apenas para pensar em algo diferente, antes de voltar para a sua paixão.

Em um determinado momento, Greg Kroah-Hartman, que havia ficado no lugar de Linus durante estas “férias” e é um dos braços direitos de Torvalds há vários anos no projeto Linux, une-se à entrevista para debater alguns tópicos.

Greg Kroah-Hartman e Linus Torvalds
Greg Kroah-Hartman (à esquerda na foto) e Linus Torvalds

Ambos comentam sobre as dificuldades dos momentos finais do lançamento de uma versão do Kernel Linux, em sua última versão (na merge window), a resolução de problemas, com mais de 70 patches importantes e coisas do tipo, acabou tornando o momento um pouco mais “tenso” do que o normal, mas comenta também que a semana de lançamento de uma nova versão é “naturalmente conturbada e sempre foi“, afirmando que o Linux ainda é o projeto Open Source com maior número de pessoas trabalhando simultaneamente a cada lançamento, mencionando que tem ocorrido um crescimento de pessoas envolvidas no projeto provindas da Índia, Ásia em geral e leste Europeu. 

Não existe um modelo de gerenciamento em massa para uma comunidade Open Source tão grande quanto essa, para muitos, eles são o modelo de inspiração, e mesmo que existam diretrizes de conduta, cada comunidade é diferente, cada pessoa é diferente e isso deve ser considerado e respeitado.

Kroah-Hartman e Torvalds comentam também sobre a inclusão de mulheres no projeto e discutem sobre os motivos delas ainda serem uma minoria, apontando que “não há nenhuma inviabilidade técnica” sobre isso, ou algum tipo de preconceito:

A comunidade Linux em si não barra, em nenhuma circunstância, a inclusão de quem quer que seja, entretanto, há fatores históricos, extra-kernel, que influenciam diretamente nesse tipo de coisa“, comentam.

A questão é  que por muitos anos as mulheres foram desencorajadas a estudar ciência exatas,como matemática por exemplo, bastando olhar para os cursos de tecnologia das universidades, onde a grande maioria ainda são homens”, complementam. 

Greg comenta também que parte dessa “culpa”, se é que se pode dizer assim, de não haverem tantas mulheres envolvidas no projeto, são das próprias empresas que compõem o quadro de desenvolvedores do Kernel, afinal,

São elas (as empresas) que indicam os desenvolvedores e arquitetos que vão trabalhar no projeto do Linux e não ‘o Linux’ que aponta os desenvolvedores, se as empresas apontassem mais mulheres, haveriam mais mulheres, além, é claro, das muitas que já participam de forma voluntária, mas não fazem parte do núcleo principal de devs“, finaliza.

Torvalds também comenta que o próprio acesso a computadores em determinadas comunidades e regiões do planeta, acesso ao ensino, ou seja, fatores sociais e econômicos, também afetam a adesão de pessoas ao projeto.

Linus complementa o discurso dizendo que se preocupa com o bem estar dos desenvolvedores do Kernel no sentido de qualidade de vida e relacionamento entre as pessoas, reconhecendo que algumas, incluindo o próprio Greg Kroah-Hartman, que o acompanhou na entrevista, podem estar perto daquele momento de “burnout”, uma expressão comum em inglês que referencia o momento em que as pessoas ficam estressadas e sobrecarregadas com trabalho ou muitas informações.

Por fim, eles comentam brevemente sobre as polêmicas do novo CoC. Apesar de estarem sempre em busca de aprimoramento, a mudança do código foi feita para sancionar algo que eles já praticavam, ou buscavam praticar, e tinham em mente há anos. A mudança pública apenas deu a oportunidade de “barulhentos fazerem barulho”, mas a verdade é que, segundo eles, o comportamento interno da comunidade Linux é diferente do que foi apresentado em alguns websites que tentaram ganhar alguns cliques.

Somos uma comunidade muito produtiva e altamente técnica, se o relacionamento entre nós não fosse minimamente bom, o resultado final não seria bom como tem sido ao longo dos anos“, finalizam.

Competitividade entre softwares Open Source

Os entrevistados comentam sobre as benesses da competitividade entre softwares de código aberto. Como o GCC e o Clang, muitas vezes inspirados uns pelos outros, os projetos melhoram juntos, como Flatpak e Snap, GNOME e KDE etc. Enfatizam que no mundo Open Source a competitividade beneficia a todos, pois as melhorias podem convergir entre os projetos, ao contrário do modelo de software proprietário.

Linus foi indagado sobre o que ele pensa do Sphere OS da Microsoft, dizendo que não é um projeto que ele tem acompanhado muito de perto, mas elogia o trabalho feito da empresa ao fazer uma versão reduzida do Linux para rodar em hardware ainda mais simples. Lamenta que algumas modificações feitas pela Microsoft (neste projeto específico, no caso, o Sphere OS) não possam ser levadas upstream para o Kernel padrão, pois eles basicamente removeram componentes importantes para outros projetos para deixar o Linux mais “enxuto” e atender a sua demanda, mas “é para isso que serve o open source“, pondera.

Vale lembrar que a Microsoft é membro Platinum da Linux Foundation e ajuda o projeto de várias formas diferentes, incluindo a sua entrada para a Open Invention Network recentemente.

Hardware compatível com Linux

Quando questionados sobre a dificuldade de incluir suporte a alguns tipos de hardware, Linus comenta que não tem visto muitos drivers e hardwares complexos de trabalhar nos últimos tempos, sendo o Linux capaz de suportar “out of the box” a maior parte do hardware disponível no mundo. Tirando casos específicos, referentes a um driver proprietário que não há como trazer compatibilidade sem fazer engenharia reversa ou algo do tipo, colocando a responsabilidade nas mãos dos fabricantes.

Um exemplo que ele menciona é o de softwares que trabalham algum hardware específico envolvendo inteligência artificial, onde ainda tem sido um pouco problemático para equipe do Linux.

Torvalds ainda comenta que as equipes que desenvolvem drivers open source para placas de vídeo (especialmente Nvidia) devem ter sempre grandes problemas, que ele, particularmente, não tem envolvimento direto, mas que tem ciência, pois são lançados vários novos modelos todos os anos e é difícil acompanhar o fluxo desses produtos especificamente, sobretudo se as especificações não são completamente abertas.

O que você achou da entrevista do posicionamento de ambos? Deixe sua opinião nos comentários e nos vemos no próximo artigo!

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