A Rússia deu mais um passo em sua estratégia de censura digital ao desconectar várias regiões do acesso à internet global durante o último fim de semana. A ação faz parte de um teste de sua infraestrutura de “internet soberana”, uma tentativa de criar um sistema nacional independente da rede mundial. Segundo informações publicadas pelo TechRadar, cidadãos dessas regiões não conseguiram acessar aplicativos populares como YouTube, Google, WhatsApp e Telegram.
Embora haja algumas exceções, nem mesmo o uso de redes privadas virtuais (VPNs), amplamente adotadas pelos russos para contornar restrições, conseguiu oferecer uma solução eficaz desta vez. Isso representa uma nova fase na repressão digital no país, que investe pesado em tecnologias e legislações bloquear informações externas.
Testes em regiões estratégicas
Os testes de desconexão afetaram principalmente áreas habitadas por minorias étnicas, como Chechênia, Daguestão e Inguchétia. Dados do grupo de monitoramento NetBlocks confirmaram que a conectividade foi restaurada no Daguestão após 24 horas, com o regulador de telecomunicações russo, Roskomnadzor, descrevendo o evento como um experimento para avaliar sua capacidade de restringir o acesso à internet estrangeira em regiões específicas.
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Embora impactante, o episódio não foi inesperado. Testes semelhantes já haviam sido realizados em julho deste ano, com o mesmo objetivo de verificar a eficácia da infraestrutura da internet soberana. O Kremlin anunciou, em setembro, um plano para investir mais de 500 milhões de dólares (cerca de 60 bilhões de rublos) nos próximos cinco anos, com foco em aprimorar o sistema de bloqueio, especialmente contra o uso de VPNs.
VPNs na mira da censura Russa
As VPNs, que criptografam a conexão dos usuários e mascaram sua localização real, têm sido ferramentas importantes para as pessoas que buscam acessar notícias internacionais e outros conteúdos bloqueados. No entanto, o governo russo intensificou seus esforços para conter o uso dessas redes. Em março de 2024, foi implementada uma nova lei que criminaliza a disseminação de informações sobre como contornar as restrições de internet, incluindo o uso de VPNs.
Atualmente, cerca de 200 serviços de VPN estão bloqueados na Rússia. Entre julho e setembro de 2024, 60 aplicativos de VPN foram silenciosamente removidos da App Store da Apple no país, elevando o total de aplicativos indisponíveis na loja para 98. Apesar disso, alguns serviços ainda conseguem operar, mas a situação está longe de ser estável.
Ao Tech Radar, especialistas da organização Roskomsvoboda descreveram o bloqueio como uma “corrida armamentista” entre desenvolvedores de tecnologia de censura e desenvolvedores de ferramentas de bypass. “Esse confronto tecnológico já dura mais de uma década, então ainda há esperança de superação, mesmo que o cenário esteja cada vez mais restritivo”, afirmou um dos especialistas.
Ampliação da repressão digital
A repressão não se limita ao bloqueio de VPNs. No mesmo dia do teste de desconexão, o Roskomnadzor anunciou planos para restringir o acesso a pelo menos oito grandes provedores de hospedagem na web, incluindo Amazon Web Services (AWS), GoDaddy e HostGator, por não atenderem aos requisitos de censura do governo russo.
Ilya Vaitsman, especialista em TI russo, destacou a gravidade da situação. Ele alertou para um possível aumento na censura contra plataformas de VPN, já que muitos desses serviços utilizam infraestrutura fornecida pelos provedores mencionados. “Embora existam outros sites e servidores pelo mundo, a situação está se deteriorando rapidamente”, afirmou.
Impactos e perspectivas
A experiência de desconexão da Rússia é uma clara demonstração do esforço do Kremlin para reforçar sua soberania digital e controlar o fluxo de informações. Além disso, levanta preocupações globais sobre o impacto de uma internet fragmentada, onde governos podem isolar populações inteiras de conteúdos internacionais.
Especialistas alertam que o fortalecimento da internet soberana russa pode servir de exemplo para outros regimes autoritários, que poderiam adotar medidas semelhantes para consolidar controle interno. Para os cidadãos russos, resta buscar soluções criativas para manter acesso às informações externas, mas o desafio é crescente.
É evidente que essa batalha pela liberdade na internet está longe de ser resolvida. Resta saber como cidadãos, organizações de direitos digitais e empresas de tecnologia reagirão a esse avanço da censura russa.
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